17/09/13

Poesia - A Professora e Poetisa, Anabela Borges, interpela-nos com o Poema: "OURO ENVELHECIDO"

Foto: ANABELA BORGES, in ENTRE O SONO E O SONHO-Vol. IV- (Chiado Editora, 2013)

OURO ENVELHECIDO

Porque estás sentada nos braços da solidão,
 e as tuas horas são feitas de silêncios, 
e querias ter a casa preenchida
 de vidas que foram tão tuas,
 e das tarefas infindas
 que te enchiam os dias. 
Querias. 
Porque querias percorrer as ruas 
com o ânimo renovado 
no regresso a casa. 
E querias que as presenças 
que não te esperam mais 
te curassem as feridas, 
as fendas que se abriram em ti,
 como as que o tempo abre na terra. 

Dizem que tens a idade maior,
 que é feita de ouro. 
Será. Mas é de um ouro envelhecido,
 como o ouro das arrecadas, 
que guardas apertadas nas mãos, 
sinal da tua passagem, outrora, 
passado apagado pelo vento que passa,
 de mão em mão. 
E já nada brilha como o ouro novo, agora. 

Querias.
 Mas como pode parecer tão simples
 o que querias?
 Pássaros que era costume esperarem-te 
de bicos abertos no ninho?
 Memórias. São memórias,
 uma seita de memórias embrulhadas em bruma
 e com um cheiro escarninho, acre e doce do que foste feita.

Não consegues lembrar-te do dia
 em que a casa ficou vazia, 
e tudo se degradou, até quase se desmoronar,
 porque todos os pássaros foram voando
 para longe de ti, até deixarem de regressar.

E tu ficaste, ouro envelhecido,
 empoeirado de branco como os teus cabelos,
 dependurada de ti, nesse silêncio enevoado,
 com uma pergunta nos olhos 
e um fio de lágrima que desce lento,
 como a água de um ribeiro
 que seja estreito de leito.

Ficas, nessa delonga, 
dependurada por um fio,
 para seres apenas sombra.

*
Tela de © Montserrat Gudiol
*

(LT)

"OURO ENVELHECIDO

Porque estás sentada nos braços da solidão,
e as tuas horas são feitas de silêncios, 
e querias ter a casa preenchida
de vidas que foram tão tuas,
e das tarefas infindas
que te enchiam os dias. 
Querias. 
Porque querias percorrer as ruas 
com o ânimo renovado 
no regresso a casa. 
E querias que as presenças 
que não te esperam mais 
te curassem as feridas, 
as fendas que se abriram em ti,
como as que o tempo abre na terra. 

Dizem que tens a idade maior,
que é feita de ouro. 
Será. Mas é de um ouro envelhecido,
como o ouro das arrecadas, 
que guardas apertadas nas mãos, 
sinal da tua passagem, outrora, 
passado apagado pelo vento que passa,
de mão em mão. 
E já nada brilha como o ouro novo, agora. 

Querias.
Mas como pode parecer tão simples
o que querias?
Pássaros que era costume esperarem-te 
de bicos abertos no ninho?
Memórias. São memórias,
uma seita de memórias embrulhadas em bruma
e com um cheiro escarninho, acre e doce do que foste feita.

Não consegues lembrar-te do dia
em que a casa ficou vazia, 
e tudo se degradou, até quase se desmoronar,
porque todos os pássaros foram voando
para longe de ti, até deixarem de regressar.

E tu ficaste, ouro envelhecido,
empoeirado de branco como os teus cabelos,
dependurada de ti, nesse silêncio enevoado,
com uma pergunta nos olhos 
e um fio de lágrima que desce lento,
como a água de um ribeiro
que seja estreito de leito.

Ficas, nessa delonga, 
dependurada por um fio,
para seres apenas sombra."

Anabela Borges, Poetisa

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2 comentários:

  1. esta poesia -- talqualmente se vê -- e bem bonita...não é minha...antes fora...abraço amigo ed parabéns à poeta amanabebla

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  2. Obrigado, Amigo Poeta Ochôa, por me alertar para o lapso de autoria! Bem haja!

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